Ó chuva! Lava também esta alma, tira dela toda a dor, a presença amarga da saudade que domina esse peito.
Lava, faz transbordar, avança sobre a represa desse coração, tira dele a água imprópria ao banho que a vida costuma querer tomar.
Nesse inverno que veio visitar-me em pleno verão, foram mortos os pássaros que sobrevoavam e haviam feito ninho sobre minha cabeça. Eles cantarolaram por certo tempo, alguma canção que me fez bem, que me fazia acreditar na existência do amor, mas agora se foi, se foram...
Ante o frio que resfria minha alma, ante a dor que povoa meu existir, há momento melhor que este para dizer Adeus?!
Ora, este é sim o momento.
E que o cinza, o colorido que virou cinzas, seja levado pela tormenta, espalhado pelo vento, que possa ir de uma vez só, para longe, para o nunca mais.
Que o tempo sepulte-o.
Que o tempo cure a ferida que em carne viva ficou a porta do meu peito, expelindo rios de sangue, sangue que se mistura as lágrimas, que se fazem um borrão rubro sobre meu travesseiro.
Tremores tomam conta da noite, mãos sentem pontas de agulha atravessando-as, são centenas delas. O ar tende a desaparecer, parece ficar sufocada... E em um impulso, uma junção de força e coragem Ella ecoa um grito e cai.
Ella permaneceu inconsciente por algumas horas. Ali, caída, com uma expressão pálida, dos seus olhos ainda fechados escorriam lágrimas.
O dia começou a clarear, a luz então invadiu seu quarto. Ella levantou-se sem saber o porquê de estar caída no chão, porém, não quis procurar razões para isso.
Para Ella, seria melhor não lembrar, afinal, ontem é passado, o que importa é viver o hoje, tão intensamente quanto puder.
“Deixarei o que foi dor para trás, não me importo se houveram alguns sorrisos, foi-se o tempo de acreditar em contos de fadas, em príncipes vindos em cavalos brancos. Agora é tempo de despertar, de viver a vida, mesmo ante as dificuldades e limitações que possam surgir, melhor viver no mundo real. O que sonhei foi apenas uma fantasia, agora me vejo de volta a terra, pronta para descobrir o novo, porém, concreto e real.”
E assim Ella fechou o diário que há meses começara a escrever, colocou-o dentro da escrivaninha velha do canto do quarto, e ali pretende deixá-lo, sem utilidade, aquilo não passava de um jornal velho.